sábado, 26 de dezembro de 2009

A culpa é dos feriados!

A quadra natalícia é propícia à distracção e à quase total alienação das pessoas em relação ao que as envolve. Independentemente da sociedade de informação em que vivemos não dar tréguas, alguns mentores de ideias peregrinas aproveitam, em nome dos grupos de interesse que representam, antecipar algumas estratégias, como que a preparar terreno para o futuro. O poder político também não resiste normalmente à quadra para efectivar algumas medidas que, de outro modo, surtiriam vagas de impopularidade se lançadas no impacto imediato dos dias mais triviais.
Este ano, um tal de Paulo Nunes de Almeida, vice-presidente da Associação Empresarial de Portugal, decidiu brindar os portugueses no dia de natal com uma medida de combate à crise: a redução do número de feriados, e o eventual alargamento da carga horária de trabalho. Trata-se de uma proposta para ser encarada como um “esforço colectivo” a tomar numa altura em que está em causa “a sobrevivência dos postos de trabalho”. Segundo esta sumidade do pensamento empresarial português, Portugal ultrapassa em feriados a média europeia, pelo que esta situação deverá ser revista em nome da produtividade do País.
Mas este representante dos empresários de Portugal, aferindo dos impactos que a medida teria nos meios eclesiásticos (que, como se viu reagiram, pela voz do Bispo do Porto, contra) foi lesto em propor o dia 1 de Dezembro como feriado cobaia a ser extinto. Ora, o dia 1 de Dezembro, feriado que assinala a Restauração da independência de Portugal face a Castela, é perspectivada pelo empresariado português como um artefacto histórico, sem sentido numa época em que estamos inseridos num “contexto ibérico”. Hábil, Paulo Nunes de Almeida assinala mesmo que este tipo de comemoração é até “um pouco contra-natura”.
Demagogia à parte, porque este tipo de argumentação não só ofende a dignidade de um patriota (e, apesar de tudo, ainda os há) como roça mesmo o risível, é preocupante a chantagem permanente que acossa os trabalhadores portugueses. De facto, este tipo de intervenção patética que vem sendo habitual no patronato português - o mesmo que pedincha compensações para aumentar o ordenado mínimo, ou coloca o país a tentar competir com chineses e novos estados membros da União Europeia quando deveria ter dado o salto para outro estádio de desenvolvimento há mais de uma década – revela bem o subdesenvolvimento intelectual em que nos situamos quando nos referimos a empresariado.
Os grandes males que afectam os índices de produtividade em Portugal não estão nos trabalhadores nem nos seus direitos. Eles residem, acima de tudo, no ultramontanismo da maior parte dos detentores dos meios de produção. E não será de estranhar que, com a democracia consolidada como se afirma quase sempre, gente da estirpe deste tal de Paulo Nunes de Almeida não venha acenar com a suspensão do 25 de Abril ou com esse feriado de conotações demasiadamente proletárias que assinala o Dia do Trabalhador. Até porque neste sentido, depressa se entende que a solução passa pelo “esforço colectivo” dos mesmos de sempre. Para que a riqueza floresça em nome do País mais desigual e com os salários mais baixos per capita da União Europeia. Mas, veja-se, a culpa provável, até pode ser dos feriados!

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