sexta-feira, 15 de maio de 2009

O Primo da China

Ao ver a capa do Expresso deste fim de semana só posso sentir-me estupefacto. Numa primeira impressão, e abstraindo-me da garrafal manchete, pensei tratar-se de um cartaz de um filme de kung-fu, daqueles que na infância me prendiam o olhar na fachada do Éden. Num segundo e momentâneo visionamento pensei que Tarantino aprontara das suas e, com Cannes no horizonte, o maior semanário português se rendera a nova incursão no zen sanguinário do cineasta americano. Afinal, e porque à terceira é de vez, de cinefília há aqui muito, ou talvez nada. Trata-se de uma foto do primo de José Sócrates, o tal que andou metido nos estranhos negócios do outlet de Alcochete e que agora anda por terras da China a treinar artes marciais 8 horas por dia, segundo o jornal. Assalta-me uma dúvida: em quem irá desancar o primo de Sócrates com tanto adestramento?

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Contra-ciclo

Em tempos de crise, um novo jornal pago chegou hoje às bancas. Numa altura em que a tendência internacional é a redução humana das redacções e até mesmo o reequacionar da continuidade de um formato como o jornal em papel (escrevi algures sobre isso num texto já aqui publicado e na decorrencia da revolução que têm sofrido muitos jornais norte-americanos) a chegada do «I» parece surgir em completo contra-ciclo. Eis algumas inquietações:
Não querendo ser injusto na avaliação deste primeiro número chegado hoje aos escaparates, tudo me leva a crer que o «I», ao contrário do que escreve o editor do jornal (“tudo isto aqui é novo”), não traz nada de inédito ao panorama da imprensa escrita, à excepção de disponibilizar em português peças do «New York Times», incluindo crónicas de alguns dos seus colunistas como Thomas L. Friedman ou Paul Krugman. Nada que, a exemplo, a «Visão» não faça recorrentemente com a «Time».
O jornal agrafado em jeito de revista faz recordar o gorado semanário «Já» de Miguel Portas. A arrumação das páginas lembra as mudanças no «Diário de Noticias» em inícios da década, cheio de sínteses e caixinhas que servem mais para dispersar do que para cativar, apesar de (e citando o argumento com que se implementou esse modelo no DN) ser esta a fórmula que melhor corresponde aos anseios do leitor moderno.
Entre algumas pobrezas que se vão detectando página a página - como falta de contexto de uma série de troca de frases soltas entre David Cameron e Gordon Brown na rubrica internacional («Radar Mundo») ou de uma síntese dos dois anos de governação Sarkozy em três caixas que apenas ali parecem estar a fechar a página (não obstante a participação de um "tal" de Vasco Rato numa das colunas a dizer «cedendo à pressão dos protestos» - vide página 16), - destaco aquilo que me parece um pouco abusivo da parte de um director de jornal que julga, na sequência dos artigos de opinião publicados e a publicar no «I», que “a opinião orienta os raciocínios”. O verbo orientar não parecerá pernicioso e denunciador de excessiva presunção quando aplicado a colunas de opinião publicadas na imprensa?
Em sintese, o «I» de informação que agora chegou tem a variável on line que prometo visitar para procurar o prometido “novo” mundo da informação. Por ora, ficarei por aí; o papel, mesmo que em provável contra-ciclo, não convenceu.

terça-feira, 5 de maio de 2009

Vasco Granja

A televisão era ainda a preto e branco. Não havia Canal Panda nem vhs e a Disney era algo a que só acedia aos domingos de manhã quando o meu pai me levava ao malogrado cinema do Caleidoscópio.
Em casa, desenhos animados era sinónimo de Vasco Granja: os toons do período dourado da Warner, o experimentalismo vindo do leste quando a Europa ainda era dual, as animações com plasticina que me inspiravam desajeitadas obras a que sonhava dar vida...
O simpático senhor que animou tantas horas da minha infância morreu ontem, aos 83 anos. Um grande bem haja a Vasco Granja, um dos nomes mais inesquecíveis da minha geração.

Sobre o percurso do grande VASCO GRANJA

sábado, 2 de maio de 2009

Desgraça de Política

O impropério e o insulto podem não ser reacções legítimas numa democracia mas acontecem com imensa facilidade quando a lógica das massas se impõe. É assim no futebol, é assim numa manifestação ou num protesto; e manda a democracia que o valor da tolerância acabe por relevar alguns dos excessos. De facto, o protesto não encontra muitas vezes barreiras de linguagem no anonimato da multidão que age e reage dentro de uma espiral de contágio sempre mais emotiva que racional. Qualquer agente político em democracia tem o dever de entender isso enquanto inevitabilidade da dimensão pública.
Há umas semanas atrás, o primeiro-ministro queixava-se que as manifestações organizadas pela CGTP persistem no insulto pessoal contra a sua pessoa. Sócrates, que gosta de se mostrar inflexível nos seus propósitos e desde sempre tem desvalorizado os sinais da rua (num autismo bem típico das maiorias parlamentares absolutas), não se coibiu a criticar os excessos de linguagem e aproveitou para relançar assim o “marketing” da vitimização que, como se sabe, potencia simpatias sobre a “vítima” e combate o “agressor”.
Quando o verbo atravessa a fronteira e se torna agressão, mesmo que tal não supere o empurrão ou o repelão, a situação extravasa para um campo que não pode ser tido como aceitável. O que sucedeu ontem a Vital Moreira no Martim Moniz, durante a manifestação do 1º de Maio da Intersindical é, de facto, lamentável porque nada pode legitimar aquele tipo de reacção por parte de alguns cidadãos, sobretudo numa manifestação organizada que é também uma festa de liberdade e de democracia.
Posto isto, convém esclarecer que o sucedido ao candidato independente do Partido Socialista às Europeias foi apenas, e felizmente, resultado da actuação de uma meia dúzia de manifestantes e não do grosso da coluna. Porém, depressa se levantaram os clamores de ignomínia por parte do PS e dos comissários políticos do governo espalhados pelas redacções dos jornais e das televisões que se apressaram a visar no campo das responsabilidades a CGTP-IN e o Partido Comunista Português.
Sem apelo nem agravo, quem olha hoje a imprensa do dia verifica que a manifestação dos trabalhadores no 1º de Maio se tornou numa exteriorização da intolerância política representada numa esquerda de raiz leninista, estalinista, guevarista, e etc., etc., etc. Em suma, quem atentamente assiste a tudo isto com base nos media e quer preservar alguma seriedade intelectual e política só pode constatar que Portugal assiste a uma vaga de desinformação que só pode servir, entre tantas coisas, o tal “marketing” de vitimização que com certeza irá surgir com enorme frequência ao longo deste ano eleitoral.
Durante a noite de ontem, e depois de ter assistido à conferência de imprensa de Vitalino Canas do PS tive mais uma vez a certeza que o país está e estará no ground zero da luta política enquanto a alarvidade dos medíocres continuar a dominar a acção política. Na verdade, nada disto surpreende se lembrarmos a ligeireza insultuosa com que alguns combatem publicamente os seus adversários políticos – basta lembrar como um quadro destacado do PS atacou, há uns dias, um histórico do seu próprio partido, recorrendo a recursos estilísticos que culminaram no julgamento de carácter para assinalar discordâncias ideológicas.
O que parece mais grave nesta situação é que a insensatez e a falta de civismo democrático de uma tão diminuta massa anónima acabaram por ganhar o lugar de protagonistas no Dia do Trabalhador. Resultado: o discurso de Carvalho da Silva foi praticamente silenciado dos blocos informativos e os milhares de trabalhadores e desempregados que encheram as ruas tornaram-se desordeiros intolerantes. Na retina ficará apenas um Vital Moreira hostilizado por manifestantes instigados em ódio destilado pelo dirigismo sindical e pelo PCP, segundo a versão oficial dos factos. Imagine-se se em Portugal se passasse, para não ir mais longe, o que sucede regularmente nas grandes manifestações em França ou na Alemanha. Partiriamos para a ilegalização do PCP e de uns quantos sindicatos?