terça-feira, 22 de abril de 2008

Quando longe, sonho Lisboa

Cidade debruçada no rio que corre e se mistura com o sal do mar. Porto de chegada, porto de partida, porto de chegada... Sempre tu, terra de marinheiros e marialvas que irrompem das águas e galgam colinas.
A tua luz branca do sol reflectido nas calçadas a abraçar os calorosos edifícios. O teu buliço a roçar o caos e as noites tranquilas dos lares antigos onde os velhos adormecem tão sós.
Minha Lisboa. Cidade que me viste nascer e crescer. Como te amo, como te odeio. Como me sinto livre ao partir das tuas amarras profundas fundeadas no Tejo e te desejo quando lá de longe te sonho no sossego da distância.

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Pensamento Crítico

Folheio o romance que actualmente leio. Houve, logo no início da narrativa, uma frase que me vincou a atenção: «Na sociedade humana, pensar é a maior de todas as transgressões». A frase surge logo nas primeiras páginas de «Casei Com Um Comunista» do norte-americano Philip Roth, e saí da boca de um personagem que é um professor de literatura inglesa. Pouco depois, acrescenta-se «Pensamento crítico, eis a máxima subversão».
Há alguns dias, num episódico destaque nos jornais, ficámos a saber que a nova reforma do sistema de ensino nacional afasta disciplinas como a Filosofia e a História do estatuto de cadeiras nucleares dos currículos do ensino secundário. A justificação parece despontar do novo conceito político que o governo do Partido Socialista faz do ensino e da visão de progresso que anuncia às actuais e às gerações vindouras, projecto esse assente numa noção que é assumida na linguagem do actual poder como uma prioridade e um desígnio nacional. Refiro-me ao conceito (projecto, objectivo?) de «Choque Tecnológico», expressão de contornos propagandísticos que compreende, tal como se pretende que indique, tecnologia abarcada com ensino, pragmatismo e competitividade.
De certa forma, a perspectiva subjacente ao conceito delimitado naquela expressão envolve mais um certo número de noções relacionadas com uma determinada linguagem da economia (a tirânica estatística da racionalidade do mercado) do que com a do progresso efectivo do povo, mais especificamente do povo português. Relacionando as medidas tomadas no sector da educação ao conceito de «Choque Tecnológico» depressa se percebe que o pensamento deve ser sacrificado em favor da racionalização de meios que possam presumir competitividade económica no mundo globalizado. Aquilo que na sua aparência parece (ou talvez não) mais estranho é o facto do denominado “choque tecnológico” do Governo não parecer saber conviver com outros saberes que não os considerados “úteis” de um ponto de vista estritamente economicista. Assim, e perante o actual racionalismo obscuro da praxis subjacente às políticas públicas, deixemos que o binómio custo/benefício imediato decida e justifique os afastamentos estratégicos de meios conducentes ao desenvolvimento do pensamento e da literacia.
Ora é precisamente a partir deste prisma que se percebe os fundamentos da razão do Poder em secundarizar uma cadeira tão vital para o fomentar do pensamento crítico como a Filosofia. Relegando os velhos e bafientos senhores da Grécia ou os mais recentes senhores Descartes, Kant, Hegel ou Marx para o fundo das salas de aulas, podemos progredir na linguagem do mundo de hoje, criando seres acríticos, anómicos e, se possível, apenas focados nas “realidades” que interessam, como se a humanidade não precisasse da Filosofia e dos filósofos para nada a não ser para atrapalhar o fluxo normal da racionalidade económica.
Na verdade, parece que se crê, no reduto de acção do Portugal do “choque tecnológico”, que a ciência se faz sem a filosofia, como se pensar o mundo nas suas múltiplas dimensões fosse um luxo a que as sociedade pós-modernas da globalização não se podem entregar. Mesmo sabendo que na origem das respostas da ciência estão questões filosóficas, eis a política ultramontana do governo português para o progresso do povo.
Junho de 2007