terça-feira, 4 de novembro de 2008

Obama (II) - uma visão sentimental

Nos inícios da década de 60 do século passado, Joseph Kappler reviu muitas das investigações feitas ao longo de décadas em matéria dos efeitos dos meios de comunicação social nas atitudes e comportamentos dos cidadãos, concluindo que os media, de facto, não persuadem os indivíduos a mudar de atitude mas sim a reforçarem atitudes para as quais já sentiam predisposição. Independentemente de toda a crítica e discussão susceptível decorrente da afirmação de Kappler, o fenómeno Barak Obama até poderia ser compreendido à luz desta conclusão.
De facto, Barak Obama potenciou na sua candidatura à Casa Branca a atitude de colocar milhões de cidadãos a acreditar em algo novo, como se a sua candidatura encarnasse um elemento fundamental na predisposição da larga maioria da população norte-americana: a vontade de voltar a haver esperança na relação entre o cidadão comum e aqueles que detêm o poder político.
Nos tempos que correm, ter esperança é uma sensação em vias de extinção na relação dos cidadãos com a política e os políticos. O descrédito semeado pelos agentes do poder ao longo de tantos anos, e tão evidente nos nossos regimes democráticos ocidentais, ocultou essa necessidade básica do homem social. Talvez por ter assumido tão eficazmente o papel, Obama fez predispor, como um efeito massificado (em todos os cantos do mundo), as pessoas para a crença na possibilidade da esperança alicerçada no mote da tão propagada «mudança».
O mais provável é que essa ansiada «mudança» não venha a ser tão substantiva quanto muitos pretendem. O certo é que hoje a América vai a votos e de forma quase inédita (pelo menos para a minha geração) meio mundo encontra-se debruçado na expectativa deste ser o primeiro dia de uma nova era, desconhecendo-se de antemão o que será objectivamente. Sem concorrência ideológica efectiva, nunca o mundo terá esperado tanto de um só homem. Para milhões, Obama não só poderá liderar a maior potência mundial como ser a esperança no futuro de um planeta a braços com crises profundas em matéria económica, social, ambiental e militar.
Esse homem, tal messias dos tempos modernos, chama-se Barak Obama, negro, quarenta e sete anos, filho de um queniano e de uma norte-americana branca, nascido no Havai, principal candidato a ocupar a Casa Branca, quatro décadas depois de Martin Luther King ter projectado um "sonho" em Washington.
Como tantos milhões, simpatizo com Obama. Apesar de acontecer lá longe, nunca um acto eleitoral terá envolvido a expectativa de tantos milhões como este, e tudo porque ali concorre alguém que parece transportar ao mundo a tocha da esperança. A minha simpatia por Obama é céptica em relação ao carácter messiânico do homem que pode transformar o mundo num lugar melhor, mas a verdade é que ele acendeu a luz da esperança em milhões de excluídos do seu país, desde negros a hispanos. Simpatizo com Obama porque há milhões de africanos que vêem a esperança renascer ao acreditarem num homem que talvez não esqueça a suas raízes. Simpatizo com Obama porque o mundo é um local cada vez mais perigoso e qualquer fenómeno, por efémero que seja, que conduza à esperança deve ser vivido, nem que seja em nome dos nossos filhos.
Obama poderá vir a ser um flop para todos aqueles que nele depositam tanto da sua crença no futuro. Para mim, alguém que não se revê ideologicamente na política norte-americana, para os párias dos EUA, para os mártires do continente africano, para os oprimidos pelos actos planetários do “império” americano e seus tentáculos. Obama pode até vir a ser o refundador do capitalismo em quem os antigos comparsas de Bush agora depositam a sua esperança para manterem à tona um sistema em crise e pelo qual são co-responsáveis.

Independentemente de tudo isso, da quase certeza nas expectativas frustradas de milhões por esse mundo fora, Obama conseguiu mexer com emoções e hoje, no dia em que pode vencer as eleições, o mundo globalizado vislumbra de novo aquilo que parecia ter esquecido: a esperança. Ou não simpatizássemos quase todos com aquele homem negro que, contra todas as expectativas, ambicionou um dia ser presidente dos Estados Unidos da América.

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