

Será precisamente através do fragilizado pistoleiro William Munny, de «Imperdoável», que Eastwood anuncia este ciclo de decomposição da sua própria imagem enquanto actor, sendo que cada papel que virá a interpretar a partir daí (se exceptuarmos «As Pontes de Madison County») é a exorcização de si mesmo enquanto herói de acção, como se o espelho que reflecte o homem envelhecido contasse toda uma história de passado que afinal, no seu íntimo, não correspondia exactamente ao pistoleiro virulento e implacável, ao militar duro e xenófobo ou ao polícia rebelde e vingador. Nesta sequência da obra de Eastwood, o Walt Kowalsky de «Gran Torino», um veterano de guerra da Coreia e operário reformado da Ford, é a mais solitária e exposta das suas personagens rumo à desmontagem final do mito, até porque ela reúne todos os traços que marcaram as personagens mais famosas de Clint Eastwood, do «homem sem nome» a Harry Callahan, humanizando-a através das suas próprias dualidades e idiossincrasias ou expondo-a através da sua maior proximidade à morte do que à vida. E não será de estranhar se, na recta final do filme, ao vermos uma lágrima rolar pela face de Walt Kowalsky, acorrer-nos que aquele que pode ser o fantasma de Dirty Harry, afinal, também chora.
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